Correio Do Povo
Prática arbitrária
Conforme amplamente divulgado, a correção monetária das faixas progressivas da tabela do IRPF aplicável ao ano-calendário 2014 não acompanhou os percentuais médios de inflação do último ano. Isso significa dizer que as pessoas receberam no último ano e receberão no transcurso deste ano, passarão a, gradualmente, arcarem com um valor mais expressivo a título de imposto de renda. Isso ocorre pelo simples fato de um aumento percentual na remuneração, sem que percentual equivalente tenha sido aplicado aos patamares de tributação, faz com que o cidadão, automaticamente, passe a arcar com um valor mais expressivo de imposto de renda. Assim, analisando-se a questão pela perspectiva puramente econômica, tal prática acarreta, sem dúvida alguma, aumento na carga tributária arcada pelo indivíduo, o que por si só deveria ser compreendido como uma medida política irrazoável e, portanto, ilegítima.
Portanto, a oposição a tal medida fiscal não se dá apenas em razão dessa constatação econômica, uma vez que inúmeros argumentos jurídicos podem ser formulados para reforçar a conclusão de que há abuso e arbitrariedade nessa medida. Se poderia dizer que essa prática representa forma disfarçada de aumento de tributo. Isso porque, além de não ter sido instituída lei tributária que expressamente determinasse a majoração de tal imposto, acaba indiretamente alavancando as pessoas físicas a uma posição mais elevada na tabela progressiva do imposto de renda sem que tenham elas apresentado qualquer aumento real no seu patrimônio.
No entanto, cabe destacar que, no passado, principalmente na década de 90, o Governo Federal adotava, como prática reiterada, uma postura ainda mais agressiva, uma vez que passava longos períodos na completa omissão no que diz respeito à aplicação de qualquer índice de atualização nas tabelas anuais do IR. Desse modo, vivemos um período em que a escala progressiva passou por aberta e escancarada depreciação financeira. Isso fez com que muitos contribuintes, individualmente, e inúmeras classe profissionais, coletivamente, fossem ao Judiciário para verem reconhecida a inconstitucionalidade dessa prática omissiva que culminava em aumento artificial de imposto, com violação da legalidade, da isonomia e da capacidade contributiva. Infelizmente, nessa ocasião, o Supremo Tribunal Federal (RE 388.312) entendeu que a questão de atualização monetária das tabelas do IR envolvia matéria de política fiscal e que, por isso, dependeria de manifestação formal do Congresso por meio de lei, não cabendo ao Poder Judiciário dispor sobre essa questão.
Não obstante esse entendimento passado do STF, considerando a atual composição da Corte, talvez seja o momento de provocarmos novamente o Judiciário para que não venha a ser permitida, nem hoje, nem no futuro, essas medidas fiscais que se valem de subterfúgios para aumentar a carga tributária a que o cidadão é obrigado a se submeter.